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quarta-feira, abril 04, 2007

Passado o instante do choque, chegou o tempo de recuperar a humanidade.






CORREIO POPULAR DE CAMPINAS, COLUNA DE ROBERTO ROMANO

Publicada em 4/4/2007


Rabino Henry Sobel


No Pequeno Tratado sobre Deus, o Homem e a saúde de sua alma, Spinoza discorre sobre o favor, o reconhecimento, a ingratidão. Os dois primeiros pontos manifestam o desejo de fazer algo bom para o próximo. Espera-se, após efetivar um ato correto, receber afeto em troca. Uma pessoa perfeita, no entanto, age sem esperança de reciprocidade e se considera obrigada a ajudar quem sofre, apenas porque nele enxerga a dor. A ingratidão é o desprezo do reconhecimento, como a impudência desafia a vergonha. O ingrato é ávido ou egoísta em excesso. Nenhum ingrato pode ser uma pessoa perfeita. As bem-aventuranças proclamadas por Jesus, judeu considerado divino pelos cristãos, já indica aos indivíduos e grupos: Sede vós, pois, perfeitos, como é perfeito o vosso Pai celestial. E o que significa “ser perfeito”? É ser humilde, chorar com as dores alheias, agir mansamente, ter fome e sede de justiça, sentir misericórdia, manter limpo o coração, pacificar disputas e guerras. Pois eu vos digo que, se a vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus. (…) Ouvistes que foi dito: Amarás ao teu próximo, e odiarás ao teu inimigo. Eu, porém, vos digo: Amai aos vossos inimigos, e orai pelos que vos perseguem; para que vos torneis filhos do vosso Pai que está nos céus; porque ele faz nascer o seu sol sobre maus e bons, e faz chover sobre justos e injustos.

O episódio que tem o rabino Sobel no epicentro, exibe lados sombrios da ingratidão jornalística. Recordo uma tarde, na Catedral da Sé lotada de pessoas que, arriscando sua vida e liberdade, foram ao culto ecumênico em memória de Vladimir Herzog. Havia uma série de escândalos no ar. O primeiro era a mentira do “regimen monstruosum” que, em nome da “civilização cristã” torturou, assassinou, perseguiu, retirou direitos dos brasileiros. A derradeira mendácia foi espalhada pelos torcionários: Herzog teria se suicidado. Naquela hora o jornalismo retomou alento, unido ao clamor popular liderado pela Igreja, OAB, movimentos em defesa dos direitos humanos. Na Sé foi homenageada a verdade, contra a mentira de Estado. No ara santa, homens graves representavam a justiça e a misericórdia divina: Paulo Arns, James Wright, Henry Sobel. Na homilia de Arns, a sentença do único juiz legítimo: “Deus faz questão de comunicar constantemente aos homens que é maldito quem mancha suas mãos com o sangue de seu irmão. (…) Não matarás. Quem matar se entregará a si próprio nas mãos do Senhor da História e não será apenas maldito na memória dos homens, mas também no julgamento de Deus. (…) Acontece facilmente que esquecemos o nosso Deus, quando achamos que sozinhos resolvemos os problemas. Mas Ele está aí, na hora do caos, na hora da desesperança, nos acontecimentos sem saída.”

Dias sombrios. Aos três sacerdotes coube uma tarefa inaudita: proclamar a esperança quando o povo brasileiro sofria desespero profundo. Quem seguiu aqueles três homens, testemunha a sua coragem, desvelo, misericórdia. Eles ajudaram o Brasil a deixar a abjeção jurídica em que estava jogado, porque souberam revelar na sua plenitude, com risco de vida, o “occulto Dei judicio”. Wright morreu coberto pelo silêncio estatal brasileiro. Arns adoecido, enfrenta injustiças com o resto de suas forças. Sobel, internado no hospital Einstein, sofre a ingratidão da imprensa, a mesma que ele ajudou a livrar das garras autoritárias. Estou certo de que ele sente mais a falta dos que lutam pelas liberdades, do que os insultos impostos por empresas jornalísticas, na busca de mais audiência ou de vender alguns exemplares a mais. Quem cometeu agressões como a da Escola de Base, desconhece misericórdia, ignora a justiça. É preciso não confundir jornalistas assim com a imprensa, mas um travo amargo toma a língua de quem defende a liberdade na escrita. Automaticamente, brota a palavra correta: que o rabino se recupere, perdoe, e siga na luta pela dignidade de todos os brasileiros.


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COMENTÁRIO: NUM INSTANTE EM QUE O GOVERNO ANUNCIA UMA REDE ESTATAL DE TV E RÁDIO, PARA COM CERTEZA LAVAR O MAIOR NÚMERO POSSÍVEL DE CÉREBROS, É BOM RECORDAR QUE A LIBERDADE É PLANTA FRÁGIL, E A DE IMPRENSA, MAIS AINDA. QUANDO, NA DITADURA, JORNALISTAS FORAM PERSEGUIDOS E MORTOS, OS TRÊS SACERDOTES, UM CATÓLICO, OUTRO PROTESTANTE, OUTRO JUDEU, UNIRAM-SE AOS QUE REPUDIAVAM O ASSASSINATO DAS LIBERDADES. COM A SITUAÇÃO DO RABINO, ONDE AS APARÊNCIAS FORAM JOGADAS PARA DESMORALIZAR UM LUTADOR PELOS DIREITOS COLETIVOS E INDIVIDUAIS, POUCOS PERCEBERAM O DRAMA SOB O RIDÍCULO. NINGUÉM É PERFEITO, SOBRETUDO NÃO É PERFEITO QUEM NUNCA ARRISCOU SUA VIDA EM PROL DOS SEMELHANTES. SOMOS UM PAÍS NO QUAL OS QUE LUTAM SOFREM TODO TIPO DE DESMORALIZAÇÃO, SEM QUE O PÚBLICO DISTINTO SE PREOCUPE COM AS CAUSAS REAIS DOS EVENTOS. MAS AQUI BANDIDOS QUE ROUBAM O ERÁRIO COMO NO CASO SANGUESSUGAS, QUE RIEM NA FACE DA CIDADANIA, COMO NO CASO DO MENSALÃO, DESAFIAM A JUSTIÇA HUMANA E DIVINA, RECEBEM TRATAMENTO DE EXCELÊNCIA. E QUANDO SEUS ERROS APARECEM EM PÚBLICO, SÃO PERDOADOS E RETORNAM, TRIUNFANTES, PARA A VIDA PÚBLICA, DEIXANDO A PRIVADA (COM TODA A POLISSEMIA DO TERMO).

QUANDO, NA DITADURA, EU ESTAVA "HOSPEDADO" NAS CELAS DO QUARTEL GENERAL DA PM PAULISTA, CERTA NOITE PUDE TESTEMUNHAR O ESQUADRÃO DA MORTE QUE VINHA PARA ME CONDUZIR PARA O FIM. FUI SALVO GRAÇAS AO MAJOR DA PM (DESCONHEÇO SEU NOME), AINDA JOVEM, QUE BARROU OS POLICIAIS ARMADOS DE METRALHADORA QUE GRITAVAM AMEAÇAS :"O PRISIONEIRO SÓ DEIXA O QUARTEL COM ORDEM MILITAR SUPERIOR". QUE, NO PLANO SUPERIOR, GARANTIU MINHA SEGURANÇA, FOI O CORONEL CONFUCIO DANTON DE PAULA, DO EXERCITO. MAS TODA A LUTA PARA GARANTIR NOSSA VIDA DEVEU-SE AO ENTÃO BISPO AUXILIAR, PAULO EVARISTO ARNS, AUXILIADO POR PESSOAS COMO SOBEL.

MINHA GRATIDÃO É IMENSA EM RELAÇÃO AO BISPO, AO RABINO, AO PASTOR WRIGHT, AO CORONEL E AO MAJOR. CADA UM DELES, NO SEU ÂMBITO, DISSE "NÃO" NO MOMENTO CERTO.

ESPERO QUE EM NOVAS SITUAÇÕES DE ARBÍTRIO, O BRASIL ENCONTRE OUTROS QUE SAIBAM DIZER "NÃO", RECUSANDO A DESCULPA COVARDE DOS QUE "SEGUIRAM ORDENS" NA ALEMANHA NAZISTA, NA ITALIA FASCISTA, NO PORTUGAL FASCISTA, NA ESPANHA FASCISTA, NA URRS ESTALINISTA, NO CAMBOJA E EM TODAS AS TERRAS ONDE A INJUSTIÇA FOI VITORIOSA, MOMENTÂNEAMENTE.

ROBERTO ROMANO

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