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sábado, setembro 20, 2008

FEBEAPA 2008: GOVERNO
QUER TIRAR O SOFÁ DA SALA


Celso Lungaretti (*)


Que falta faz o jornalista, teatrólogo e humorista Sérgio Porto! A cada dia nossas otoridades propõem medidas tão obtusas quanto (ou mais ainda que) aquelas detonadas no Festival de Besteiras que Assola o País.

Para as novas gerações terem uma idéia de quão asnático era o besteirol oficial na década de 1960, eis uma das pérolas expostas por Stanislaw Ponte Preta:
-- O Diário Oficial publica "Disposições de Seguros Privados" e mete lá: "O Superintendente de Seguros Privados, no uso de suas atribuições, resolve (...), "Cláusula 2 ˜ Outros riscos cobertos ˜ O suicídio e tentativa de suicídio ˜ voluntário ou involuntário".

É de um ridículo similar o projeto que o Governo Federal encaminhou ao Congresso, no sentido de criminalizar a publicação/difusão, por parte da imprensa, do lixo resultante de escutas telefônicas. Lembra a velha piada do pai que, impotente para impedir que a filha transe com o namorado no sofá da casa, livra-se do sofá...

A missão da imprensa é levar ao conhecimento dos cidadãos tudo que lhe cair nas mãos e for, a seu critério, considerado relevante para os leitores. O papel do Estado é evitar essa proliferação descontrolada da bisbilhotagem eletrônica, principalmente:

1) impondo normas bem mais rigorosas para a autorização dessas escutas por parte do Judiciário, pois, por violar o direito à privacidade dos cidadãos, deveria ser sempre o último e excepcional recurso de uma investigação policial, e nunca o primeiro, como está sendo;

2) impondo máximo rigor penal contra os arapongas que efetuam escutas clandestinas e seus contratantes, bem como contra os cidadãos (inclusive autoridades) que vazam para a imprensa o material obtido em escutas legais ou ilegais.

Quanto ao primeiro item, os saudosos e/ou carentes de um estado policial objetarão que conseguir provas contra um Daniel Dantas da vida justifica quaisquer excessos. Discordo totalmente.

Ninguém passa o tempo todo telefonando para tramar maracutaias. Também trata de assuntos pessoais, que não podem nem devem ficar disponíveis para a curiosidade doentia de policiais e arapongas.

Falemos com sinceridade: na hipótese de que Dantas tivesse conversado no telefone sobre as posições em que transaria com a/o amante (sei lá qual a orientação sexual dele) e isso houvesse sido captado numa escuta, algum de vocês botaria a mão no fogo, no sentido de que o registro seria imediatamente apagado, como deveria? Fala sério. Com certeza, no mesmo dia a transcrição teria passado por um sem-número de mãos e inspirado um sem-número de gracejos maliciosos.

Nem mesmo sendo quem é, um Daniel Dantas mereceria ser ridicularizado dessa forma; muito menos a outra pessoa, não necessariamente envolvida com as atividades ilícitas de Dantas.

Então, está mais do que na hora de as escutas telefônicas passarem a ser encaradas como exceção aplicável a pouquíssimas investigações, e não como regra de praticamente todas as investigações.

Quanto a proibir-se a imprensa de tornar público o obtido nessas escutas, tem o inconveniente adicional de retirar dos cidadãos a possibilidade de darem sua versão sobre aquilo que lhes é imputado.

Os citados na imprensa têm sempre como exigir espaço para desmentidos ou justificativas. Impedidos de recorrer à mídia, os vazadores de informações utilizarão a Internet, na qual é praticamente impossível evitar o repasse da mensagem e dificílimo descobrir quem a colocou em circulação.

Ou seja, será quase nula a possibilidade de punir-se o responsável e bem mais problemático apresentar-se "o outro lado" àqueles que foram atingidos pelo e-mail acusador.

Em vez de fazer propostas descabidas como esta, cuja rejeição pelo Congresso é praticamente certa, o Governo Federal deveria, para começo de conversa, cumprir sua obrigação de reprimir as escutas ilegais e entregar à Justiça os responsáveis por tais crimes.

Um governo cujo ministro da Justiça candidamente aconselha os brasileiros a nada falarem de comprometedor ao telefone não tem moral nenhuma para ditar normas a terceiros.

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