Ministro chama de "constrangedoras" declarações de juiz e promotor sobre jovens torturados
colaboração para a Folha Online
O ministro Paulo Vanucchi (Direitos Humanos) criticou nesta segunda-feira as declarações do desembargador Luís Soares de Mello --do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo)-- e do promotor Marcelo Alexandre de Oliveira, e afirmou que o CDDPH (Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana) deve criar uma comissão especial para acompanhar o caso dos três jovens mantidos presos por um crime que, aparentemente, não cometeram. À Folha, o desembargador defendeu a manutenção da prisão dos acusados, enquanto o promotor do Ministério Público Estadual afirmou que todo preso diz ser torturado.
"As declarações na imprensa do desembargador e do membro do Ministério Público elas são, no enfoque dos direitos humanos, constrangedoras. O Ministério Público declara que todo o bandido alerta ter sido torturado. Bom, gostaria de perguntar, se todos alegam é prova de que não há tortura?", questionou o ministro, em São Paulo.
Na última quarta-feira (3), Renato Correia de Brito, 24, o seu primo, William César de Brito Silva, 28, e o amigo, Wagner Conceição da Silva, 25, deixaram o CDP (Centro de Detenção Provisória) de Guarulhos, após serem mantidos presos por dois anos em uma cela superlotada sob a acusação de terem violentado e assassinado uma garota de 22 anos.
Os três, que dizem só ter assumido o crime após serem torturados por policiais militares e civis, foram soltos por decisão da Justiça cinco dias depois de Leandro Basílio Rodrigues, 19, chamado pelos policiais civis de "maníaco de Guarulhos", ter admitido o assassinato de Vanessa Batista de Freitas, 22, ex-namorada de Renato.
Segundo Vanucchi, uma pesquisa da secretaria dos Direitos Humanos, realizada entre 2004-2005, revela que das 479 denúncias judiciais de presos que afirmam ter sido torturados, apenas cinco resultaram em condenações no país. "É um número que estimula a impunidade", disse.
"[O caso] É gravíssimo. Para não falar só de coisa ruim, que bom que o Brasil não tem pena de morte, porque, se tivesse, é um caso em que a pessoa já podia ter sido executada, aí aparece depois o verdadeiro homicida confessando", completou.
O ministro defendeu ainda que, caso seja comprovado algum "deslize" ou "descuido" da Justiça, o caso deverá ser levado aos "conselhos superiores". "Por isso queremos examinar todas as peças do inquérito, porque aparentemente houve uma falha grave, e nós queremos estudar a peça para ver se havia elementos concretos, nítidos, nos autos que tornam então a situação. Aí se for Ministério Público, se for juiz que tiver cometido esse tipo de descuido, deslize ou o quer que seja, cabe sim levar aos conselhos superiores", afirmou Vanucchi.
De acordo com Vanucchi, a lei 9.455, de 1997, estabelece penas elevadas para os crimes de tortura, que podem chegar a até 18 anos de prisão. "Infelizmente, o judiciário não se formou, não foi preparado para essa idéia de compreender que as leis aprovadas tem de ser cumpridas. Não pode haver no Brasil lei que pega e lei que não pega", disse.
Segundo o ministro, desde a década de 80, o Brasil conta com programas combate à violência policial, que incluem a inclusão de cursos --na academia de polícia-- de direitos humanos. No entanto, o episódio revelaria que as politicas existentes no Brasil ainda são "insuficientes". "Por isso, nossa ouvidoria já solicitou todas as peças de inquérito do processo, a ficha corrida destes policiais, vai conversar com o desembargador, com o juiz de primeira instância, vai conversar com o ministério público, e vai repercutir pelo Brasil inteiro como se deve fazer", disse.
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