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domingo, novembro 09, 2008

JORNAL DO COMMERCIO, RECIFE

» REFLEXÕES PÓS-ELEIÇÃO
2008, a eleição da reeleição?
Publicado em 02.11.2008

Apesar do expressivo percentual de recondução de prefeitos – 95% –, especialistas atestam o desejo de continuidade, não a consolidação da reeleição no Brasil


Bruna Serra e
Joana Rozowykwiat

politica@jc.com.br

Terminadas as disputas municipais, o resultado das urnas levou o instituto da reeleição de volta ao centro do debate político. Dos 20 prefeitos de capitais que concorreram a um novo mandato, 19 conseguiram mais quatro anos no Poder, sendo 13 no primeiro turno e seis no segundo. Significa que 95% deles obtiveram sucesso, o maior percentual desde que o segundo mandato consecutivo passou a ser permitido, em 2000. Em 2008, o povo mandou um recado. Seria a consagração da reeleição? Um sinal de que gestores-candidatos têm vantagens sobre os adversários? Juristas, pesquisadores e políticos chamam a atenção para o conjuntural desejo de continuidade, a falta de fiscalização contra o uso da máquina e o pragmatismo do eleitor, que tenderia a escolher quem já mostrou resultado.

Dados coletados pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) apontam que o índice deste ano supera o das eleições de 2000, quando 16 dos 21 dos prefeitos de capitais que tentaram um novo mandato se reelegeram (76,19%). Já em 2004, 11 tentaram a reeleição e oito se mantiveram no Poder (72,72%). Neste ano, de todos os 3.357 candidatos do País a um novo mandato, 2.245 prefeitos permanecerão no cargo. O dado não inclui os seis gestores que venceram no segundo turno.

As opiniões sobre o que explicaria esse sucesso da reeleição são divergentes. Na visão do cientista político e professor da Universidade de Brasília, Octaviano Nogueira, é cedo para assegurar que a reeleição está consagrada. “A reeleição teve 100% de eficácia nacionalmente, já que Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Lula (PT) foram beneficiados por ela. Na esfera municipal eu avalio que os percentuais realmente cresceram, mas o que se vê é cada dia mais os gestores usando a máquina pública em benefício próprio”, opinou Nogueira.

O professor, contudo, acredita que acabar com a reeleição e ampliar os mandatos é um erro. “Essa proposta desse deputado federal (Devanir Ribeiro do PT) é uma cretinice. O que temos de melhor na eleição brasileira é o calendário e ele quer modificar? Isso não faz sentido”, criticou.

Professor de Filosofia e Ética da Unicamp, em São Paulo, Roberto Romano avalia que o gestor que cumpriu bem seu mandato já sai na frente na disputa pela recondução. “Ele já tem um cacife importante. O eleitor tende a ser conservador. Prefere não mudar o que está indo bem, diante de um candidato novo, que ainda não mostrou suas qualificações”, avalia.

De acordo com Romano, uma questão mais grave na reeleição é o caminho que o prefeito tem que percorrer para manter o apoio do eleitores. O professor avalia que o gestor precisa construir boas relações com deputados e senadores, para conseguir mais recursos, ter mais obras e, conseqüentemente, uma maior influência na população.

“O prefeito trata com a população cotidianamente. Com poucos recursos, o eleitor todo dia em cima, e a lei exigindo moralidade, ele consegue recursos por meio dessas alianças, que são uma via de mão dupla. Isso consolida a prática do favor, do padrinho político. Por isso, a corrupção está tão concentrada no município”, constata.

Romano acredita que o instituto da reeleição desequilibra as disputas. “O prefeito que não consegue se reeleger falhou nas alianças e no ordenamento das políticas sociais. O que consegue o segundo mandato pode alçar vôos mais altos ou virar uma espécie de dono da cidade, com o perigo de impedir o nascimento de novas posições, até dentro de seu próprio partido. Pode criar também uma certa acomodação”, adverte. Para ele, o ideal seria que a reeleição fosse permitida apenas para a Presidência, da República onde a estabilidade de um projeto se torna mais necessária.

Autor da proposta que criou a reeleição, o ex-governador Mendonça Filho (DEM-PE) discorda que a possibilidade de dois mandatos consecutivos seja sinônimo de uma recondução automática, atribuindo a farta estatística à conjuntura nacional. “O fenômeno dessa eleição foi o desejo de continuidade. O número de reconduções aumentou tendo em vista um momento. É um dado circunstancial”, avaliou. Mendonça entende que rejeição à mudança, nessa eleição, deve-se à conjuntura do crescimento econômico, aumento da renda e as políticas sociais. “Isso aconteceu independentemente de ser governo ou oposição”, ponderou.

Mendonça, candidato derrotado à prefeitura do Recife, reconheceu que os gestores-candidatos são mais conhecidos e levam vantagem. Por isso, entende, a discussão necessária deve ser o uso da máquina. “Uso da máquina independe da reeleição. Tem de ser impedido em qualquer circunstância. Tem que haver um poder de fiscalização duro e severo para impedir abusos de quem está no Poder em benefício próprio ou de terceiros”, cobra.

Para ele, mais do que criar novos mecanismos para assegurar fiscalização, como já propõe o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Carlos Ayres Britto, é preciso fazer valer os que já existem. “O Brasil precisa aprender a punir”, defende o democrata que, na eleição, foi autor de várias denúncias de uso da máquina contra o adversário petista, eleito sub judice.

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