Orlando Tambosi
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A derrota do presidente venezuelano, coronel Hugo Chávez, no referendo do último domingo, lança no ar uma dúvida: a população parece se identificar mais com a sua pessoa do que com o seu projeto de implantar no país “o socialismo do século XXI” - que daria um passo significativo caso vencesse a proposta de reforma constitucional. O fato é que Chávez perdeu três milhões de eleitores em menos de um ano. A abstenção alcançou mais de 40 por cento do eleitorado, causando menos estrago aos oposicionistas que ao chavismo. Mas ainda é cedo para dizer que seu projeto totalitário foi derrotado. O coronel tentará implantar o “bolivarianismo” por outros meios. Afinal, como ele próprio disse, só perdeu “por enquanto”, pois o país ainda está “imaturo” para o processo.
A oposição está esfacelada, mas alguns personagens despontaram como vencedores, quebrando a monotonia da política venezuelana. Em primeiro lugar, o ex-ministro da Defesa e ex-companheiro de Chávez, general Raúl Baduel, de quem se diz que atuou decisivamente para que o presidente aceitasse o resultado das urnas. Com isso, conseguiu estabelecer alguma ligação entre as Forças Armadas e a sociedade. Em segundo lugar, os estudantes, que conquistaram as ruas desde a cassação da RCTV, realizando expressivas manifestações contra o chavismo. Em terceiro lugar, a Igreja Católica, cuja hierarquia lançou manifesto contra o projeto governista e foi violentamente atacada por Chávez. Sem uma articulação entre esses personagens, dificilmente a sociedade venezuelana poderá contrapor à estatolatria chavista um projeto que recupere as instituições democráticas que ele vem corroendo.
Nesse sentido, há um longo caminho a percorrer. Não existe independência dos poderes, característica de qualquer democracia. O Executivo manda e desmanda. A Assembléia Nacional, por exemplo, está deslegitimada: seus integrantes foram signatários da proposta rejeitada. Seria necessário eleger um novo congresso verdadeiramente representativo dos interesses da população. O próprio Supremo Tribunal de Justiça está em situação difícil, já que rejeitou todas as ações de inconstitucionalidade interpostas contra a reforma golpista. Deveria, portanto, conforme comenta uma analista política venezuelana, ser renovado com magistrados “que cumpram seu dever, que defendam a Constituição e as leis e, sobretudo, que nos defendam das ambições autoritárias do Executivo.” O quadro de subserviência institucional se revelou ainda mais nitidamente no escandaloso comportamento do Conselho Nacional Eleitoral, que postergou a divulgação dos resultados até que o candidato à tirania se mostrasse disposto a aceitá-los. Se o povo venezuelano demonstrou maturidade democrática, o tribunal não o fez.
Mas o fato é que a grande derrota de Chávez repercutirá negativamente em governos vizinhos, como a Bolívia de Evo Morales, o Equador de Rafael García e a Nicarágua de Ortega, todos acólitos do autoritário líder populista e de sua excêntrica atração por caminhos que a história descartou por desastrosos. E já repercute também aqui, entre frustrados entusiastas da aventura bolivariana que, nos partidos ditos de esquerda, vêem em Chávez um novo guia. Ainda que consiga, dentro de casa, impor sua vontade até o fim do longo mandato, a fanfarronice mussoliniana do coronel causa profundo mal-estar internacional, a exemplo da vizinha Colômbia e da Espanha, não excluído o Brasil. Aqui, se conta com efusivo apoio do governo Lula, enfrenta a oposição do congresso para o ingresso da Venezuela no Mercosul, cujo pacto fundador estabelece uma condição básica: o respeito à democracia. Não é o que acontece na Venezuela sob Chávez, com sua notória ambição pela tirania.
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E o nosso vingador, Sponholz
