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terça-feira, dezembro 11, 2007

Segurança com paz e democracia. Jornal da USP, Ano XXIII nº.816 de 3 a 9 de dezembro de 2007.

Segurança com paz e democracia. Jornal da USP, Ano XXIII nº.816 de 3 a 9 de dezembro de 2007.

Lançado durante evento no Memorial da América Latina, livro reúne artigos de vários especialistas que tratam da controversa e difícil questão da defesa nacional.

Como assegurar a defesa das fronteiras do Brasil e quais as estratégias a serem desenvolvidas para consolidar a democracia brasileira com uma perspectiva de cooperação e de paz, priorizando os legítimos interesses nacionais? Na expectativa de propiciar reflexões sobre esse tema tão controverso, o Memorial da América Latina lançou, no dia 21 de novembro, o livro Segurança e defesa nacional ˆ Da competição à cooperação regional. Organizado pelo cientista político Eliézer Rizzo de Oliveira, a obra reúne artigos que versam sobre ética, conceitos estratégicos, segurança pública e ameaças à democracia da América Latina. A edição tem o apoio do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.


„Esse é um tema muito controverso. Sua relevância é estratégica para a vida do Estado brasileiro no presente como no passado e, especialmente, para a sua preservação soberana no futuro", observa Fernando Leça, presidente do Memorial da América Latina. „O grande desafio é equacionar a defesa nacional no âmbito do regime democrático, consolidando uma perspectiva de cooperação e de paz sem qualquer desconsideração com os legítimos interesses brasileiros."
Na introdução do livro, Fernando Leça e Eliézer Rizzo consideram que há muito a progredir no tratamento da defesa nacional. „Até porque boa parte das forças sociais, da representação política nos diversos níveis da Federação, dos dirigentes de entidades educacionais e culturais e dos partidos políticos, e dos presidentes da República atribuem à defesa nacional uma importância estratégica que não corresponde às necessidades do nosso país."

Os autores ressaltam que a defesa nacional se encontra imersa num conjunto de paradoxos. „O primeiro deles é que o País está de acordo sobre a preservação da integridade do território nacional, nossa porção amazônica continuará sob a soberania do Brasil, o mesmo no tocante às demais regiões, mas nossos governantes não atribuem suficientes recursos para que a defesa nacional se aplique, com eficiência, na guarda e na preservação do território nacional."

Na primeira parte, apresenta o ambiente internacional através dos artigos de especialistas como Roberto Romano da Silva, Oliveiros S. Ferreira, Roberto Godoy, Héctor Luis Saint-Pierre, Suzeley Kalil Mathias, Wanderley Messias da Costa e Antonio Jorge Ramalho da Rocha. E, na segunda parte, os ensaios traçam um panorama sobre a segurança das fronteiras do Brasil, reunindo textos de Augusto Heleno Ribeiro Pereira, José Carlos Cardoso, Jorge Armando Felix e José Alberto Cunha Couto, entre outros.

O lançamento do livro, em São Paulo: reflexões para um Brasil soberano

Amplo debate ˆ „Os defensores do Estado precisam ser como os cães, mansos para com os de casa e ferozes contra os estranhos." Esse pensamento do filósofo grego Platão é lembrado no ensaio de Roberto Romano da Silva, cientista social e professor titular da Unicamp. „Não existe juízo ético no Ocidente que fuja das formas propostas na República e nas Leis platônicas. Um Estado, como diz o filósofo, é a máquina que permite viver em conjunto, exige a justiça e a amizade entre os cidadãos", escreve Romano, referindo-se a duas grandes obras do pensador do século 4 antes de Cristo.

Romano vai pontuando a defesa nacional em uma perspectiva filosófica para buscar a compreensão dos problemas atuais. „A chave do crescimento nacional, pelo menos num de seus prismas relevantes, é a formação técnica e científica do maior número de indivíduos no mercado de mão-de-obra", defende o professor. „Se algum país quiser soberania, ele precisa cuidar dessa formação em todos os níveis. Caso contrário, ficará relegado à condição de consumidor de técnicas, já ultrapassadas nos países centrais, reiterando a desigualdade crescente de riquezas e do conhecimento. Hoje, os 20% dos ricos partilham 80% do PIB mundial. E parte eficaz desse PIB é aplicada a gerar novos saberes e técnicas a serviço de seus países, contra os Estados que não aplicam na formação do seu povo em favor das finanças especulativas."

No artigo „Ameaças às democracias da América Latina", a cientista política Suzeley Kalil Mathias lembra que, após os atentados de 11 de setembro de 2001, a ameaça que ganhou maior ênfase foi o terrorismo. „Para o caso específico da América Latina, as tentativas de relacionar as atividades do tráfico de drogas com questões étnicas aumentaram e o Plano Colômbia é uma prioridade. Esse plano prevê a injeção de milhões de dólares em armas e em assistência para erradicar plantações de coca."

Wanderley Messias da Costa, professor do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, traça um panorama detalhado sobre os cenários geopolíticos e os desafios da integração do Brasil. „Do ponto de vista político ou geopolítico, entretanto, o mais interessante desses processos que se desenvolvem no continente, na atualidade, é aquele representado pelo conjunto de iniciativas e articulações envolvendo a América do Sul e que estão promovendo-a rapidamente para a posição de uma região geopolítica, isto é, uma entidade política transnacional dotada de unidade mínima e arcabouço institucional baseados em princípios e macro-objetivos comuns nas relações internacionais."
„De onde viemos e para onde poderemos estar querendo ir?" questiona José Alberto Cunha Couto, capitão-de-mar-e-guerra da reserva da Marinha do Brasil em seu artigo. Retrata a realidade dos brasileiros que parecem, como ele próprio define, ignorar fronteiras e marcham em busca de melhores condições de vida. „Os caboclos do Pará oriental vão para a Guiana Francesa em busca de emprego; os garimpeiros do Médio Amazonas embrenham-se na Guiana, Suriname e Venezuela; cearenses e descendentes ocupam os Departamentos de Pando e Beni, na Bolívia; gaúchos e paranaenses abrem campos de soja em Santa Cruz; no Paraguai, os emigrados já são 400 mil e conhecidos como Œbrasiguaios'. Em suma, toda essa gente continua marchando com o tambor de Tordesilhas e parece não ter ouvido falar do Tratado de Madri, do Tratado de Santo Ildefonso ou, sobretudo, dos esforços de Rio Branco. O tão temido imperialismo brasileiro, corretamente negado pelos governos em Brasília, continua existindo na prática das populações que se movem cruzando fronteiras, que parecem ser apenas riscos imaginários de giz." Couto observa que a fronteira terrestre deve merecer uma profunda discussão de sua função pela sociedade e que é importante o desenvolvimento de uma política inteligente de imigração, como um dos futuros motores do crescimento brasileiro.

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