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terça-feira, agosto 05, 2008

COMENTÁRIO:

Gosto bastante da jornalista Cantanhede. Seus artigos, de modo costumeiro, são lúcidos e penetrantes. Não é o caso dos últimos escritos sobre as Farc e seu embaixador no Brasil. No texto abaixo fica bem clara a fragilidade lógica e factual de sua argumentação. Cantanhede abusa da arma retórica chamada paradoxo. O termo vem do grego "opinião" (doxa) e significa "ir contra a opinião corrente"(para ten doxan). Receita eficaz para atrair o público, no arsenal da retórica, é defender causas perdidas ou injustificáveis. É assim que o orador Górgias fez o elogio de Helena, personagem odiado por todos os gregos. É assim que Rousseau, indo na contramão das Luzes, faz a crítica das técnicas e das artes.

Muitos jornalistas tentam usar a técnica do paradoxo, tendo em vista acicatar a opinião comum ou defender coisas impossíveis de serem defendidas.

Só examino, no artigo de Cantanhede, o símile entre Stroessner e o dito "embaixador das FARC". Quando o tirano paraguaio veio para o Brasil e foi aceito como exilado, suas bases de poder no Paraguai eram frágeis em demasia (ele caiu justo por tal motivo) e não haveria risco para o nosso país, tanto em termos de fronteira quanto de ação em nosso território. A situação das FARC é outra. Embora enfraquecidas, elas dominam parte do espaço Colombiano, ameaçam e invadem países vizinhos (se com a cumplicidade dos governos daquele países, é outra história), exercem diuturnamente, a partir de suas bases, atividades bélicas e criminosas, com os seus negócios de narcóticos. Interessa, sim, saber o que tal grupo faz no Brasil. E se existem pessoas que operam em seu nome, aqui, criminosas seriam as nossas autoridades se aceitassem o fato.

Teria alguma coisa a dizer sobre os e mails. Sim, qualquer um pode inventar temas e pessoas em mensagens eletrônicas. Mas as investigações em andamento e já feitas, mostram demasiada coerência entre os emissários e os destinatários, incluindo aí as pessoas referidas nas mensagens. A prudência manda não aceitar a priori a veracidade das mensagens,mas também exige que não se descarte a priori o seu conteúdo de verdade.

Operar em sentido paradoxal pode trazer luz para aspectos de um debate, antes ignorados. Mas pode servir como cortina de fumaça para proteger interesses desconhecidos. E perigosos.

Roberto Romano








São Paulo, terça-feira, 05 de agosto de 2008



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ELIANE CANTANHÊDE

Chifre em cabeça de cavalo

BRASÍLIA - Alfredo Stroessner foi ditador do Paraguai de 1954 a 1989 e não era flor que se cheirasse -que o digam suas vítimas e descendentes. Mas, ao ser chutado do poder, veio parar no Brasil, instalado cômoda e tranqüilamente na capital da República como exilado político, até morrer em 2006 de morte morrida, aos 93 anos de idade.
Isso não significa que o governo brasileiro financiasse o terror paraguaio, nem articulasse um golpe no país vizinho, nem... nem coisa nenhuma. Apenas concedeu-lhe um direito internacionalmente reconhecido: o asilo político.
Agora, há um deus-nos-acuda porque o Brasil acolhe o cidadão colombiano Olivério Medina, ex-padre que se apresenta como "embaixador" das Farc e cuja mulher, uma brasileira, trabalha no Ministério da Pesca. Entonces, pergunta-se: 1) o país que acolheu Stroessner por 17 anos não pode fazê-lo com Medina por quê? 2) nem ele nem sua mulher podem trabalhar e devem morrer de fome?
Essa discussão está fora de controle. A crítica que se deve fazer ao governo Lula é outra, por ter sido tão rápido e tão eficiente ao entregar os dois boxeadores cubanos de bandeja (ou melhor, de avião venezuelano) para o regime nada amistoso de Fidel Castro. Não por dar a Medina um status de asilado.
É como os e-mails das Farc citando brasileiros: isso não prova nada, muito menos participação na guerrilha, em contrabando de armas e cocaína, exportação de revoluções e articulações para derrubar Uribe.
Estamos carecas de saber das antigas ligações de setores da esquerda brasileira com as Farc, mas as Farc mudaram, o PT mudou, a turma do Planalto está feliz da vida com o poder. Ninguém mais fala em reformas, quanto mais em revolução em país alheio!
No máximo, pode-se falar em saídas negociadas entre Uribe e Farc, para evitar um mar de sangue. E daí? Com tantos problemas reais, é pouco para a gente ficar botando chifre em cabeça de cavalo.

elianec@uol.com.br

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