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quinta-feira, abril 10, 2008

No site Mulheres de Olho (http://www.mulheresdeolho.org.br) resenha do livro de Roseli Fischmann

Roseli Fischmann, pesquisadora e professora do programa de pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e coordenadora do grupo de pesquisa ‘Discriminação, Preconceito, Estigma’, apresenta um ensaio sobre a delicada relação entre religião e poder. ‘O Estado Laico’, um dos novos 14 títulos da Coleção Memo, editados dentro das celebrações pelo 19º aniversário do Memorial da América Latina, em São Paulo, propõe um debate a respeito das influências que a Igreja impõe sobre as importantes decisões do País. A obra, em formato de bolso, traz um panorama atual dessa relação e levanta as mais recentes polêmicas, como a descriminalização do aborto, a que o Vaticano exerce feroz resistência.
Para a autora, o caráter laico do Estado é expansivo, e não restritivo. A partir daí ela aborda os direitos de cidadania, o papel do Estado em defendê-los e a garantia da liberdade. Traça também um histórico da influência da Igreja no Brasil - citando, como exemplo, o Padroado, espécie de concessão de direitos a civis dedicados a difundir os interesses do pontificado - e explica o que caracteriza a laicidade de um país, bem como a violação desse princípio. O ordenamento jurídico brasileiro propõe, aberta e claramente, um Estado laico, atributo que nem mesmo o argumento de que o preâmbulo da Constituição “invoca Deus” suprime. Esse tipo de influência se configura, portanto, como violação do princípio da laicidade, porque, se efetivada, na prática instalaria o Estado confessional.

Sobre o aborto no Brasil, a autora destaca:

“Um Estado laico não pode mais se negar a reconhecer, por exemplo, como a criminalização do aborto tem levado a um grande número de mortes que seriam evitáveis e que essas mortes concentram-se entre as mulheres pobres e negras; mais ainda, que o risco de mais mortes continua, por falta de atendimento. A criminalização do aborto tem exposto, também, o tratamento diferenciado dado a cidadãs, conforme sua origem socioeconômica: mulheres sem recursos financeiros, quando conseguem ajuda médica para as conseqüências da clandestinidade, acabam expostas em sua intimidade e incriminadas. (…) Quem vive sob o cauteloso Estado laico terá certeza de que não será discriminado: por ter uma crença, por mudar sua escolha religiosa ou por não ter fé”.

Roseli Fischmann não escreveu um texto técnico, mas sim um ensaio que reúne experiência de mais de duas décadas lidando com o tema, com o objetivo de combater, comparativamente, afirmações imprecisas como a de que “o Brasil é o maior país católico do mundo”, que levam a análises tendenciosas. Sua busca é “por um esclarecimento (no sentido de Theodor Adorno) que propicie a compreensão desse percurso histórico tão relevante para a liberdade e a dignidade humana”, disse a autora ao Mulheres de Olho, sugerindo ainda a seguinte citação:

“Esse tipo de desqualificação – não pelos feitos ou defeitos públicos, mas por rótulos, os quais apenas repetem o pathos* que tem levado este país a uma estranha capacidade de se recriar na desigualdade estrutural que o marca – não cabe em um Estado laico, que, por princípio rejeita rótulos, enquanto acolhe identidades.”
Angela Freitas/ Instituto Patrícia Galvão

* Nesse texto, “pathos” indica paixões, afetos e sentimentos vividos coletivamente em uma sociedade, como resultado de processo histórico-cultural, mediante interações e interlocuções que se realizam com base em imagens compartilhadas, não necessariamente vinculadas à verdade ou à justiça”.

Serviço: Para adquirir a publicação, entre em contato com o Memorial da América Latina, setor de publicações; editor@memorial.sp.gov.br, (11)3823-4600. Fale com a editora, Leonor Amarante.
Sugestões de leitura: artigos de Roseli Fischmann, Roberto Romano e Jorge Szeinfeld publicados na revista ‘Nossa América’ n. 26, cuja versão em PDF está disponível, por tempo limitado, bastando buscar aqui.

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