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quinta-feira, abril 03, 2008

O GLOBO 03/04/2008



Sindicalistas comemoram com Lula sanção de lei das centrais e veto a controle do TCU

Publicada em 02/04/2008 às 23h19m
Maria Lima e Ricardo Galhardo - O Globo

BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu em uma solenidade nesta quarta-feira um grupo de mais de 50 sindicalistas para comemorar a sanção da lei que legaliza as centrais sindicais e o veto do petista ao artigo que obrigava essas entidades a prestar contas do uso do imposto sindical ao Tribunal de Contas da União (TCU). Entre os presentes estavam o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, e o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho, presidente da Força Sindical. A festa que lotou o Salão Leste do Planalto começou a portas fechadas. A alegação foi de que seria um encontro privado e nem a Radiobrás registraria a confraternização. Depois de protesto dos jornalistas, a solenidade de sanção da lei que legaliza as centrais sindicais foi aberta à imprensa. (Você acha que os trabalhadores têm como fiscalizar os gastos dos sindicatos?)

Os dirigentes sindicais se revezaram no microfone para bajular o presidente e agradecer o veto à medida que abriria a caixa-preta do uso de cerca de R$ 1,2 bilhão anuais - R$ 100 milhões só para as centrais. Lula foi o último a falar. Disse que, desde a aprovação da lei, nunca teve dúvidas de que vetaria a fiscalização.

Lula alegou que isso poderia servir de pretexto para perseguição nos sindicatos. Contou que o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo sofreu duas intervenções. Em uma delas, em 1980, disse que o então ministro do Trabalho, Murilo Macedo, foi de banco em banco onde o sindicato tinha contas procurando coisas erradas. Mas, no final, dava sua gestão como exemplo.

" Desde o momento em que acabou a votação na Câmara, eu não tive dúvida de que iria vetar a fiscalização do movimento sindical "

- Desde o momento em que acabou a votação na Câmara, eu não tive dúvida de que iria vetar a fiscalização do movimento sindical - disse Lula: - Eu já fico sabendo em cima de quem iria a fiscalização. Eu lembro uma vez em que você, Paulinho, divergiu de alguém e foi vítima de muitas acusações. Já imaginaram a cada eleição os sindicatos sendo alvo de fiscalização? O trabalhador deve ser capaz de fiscalizar seu sindicato, por isso eu vetei - disse Lula.

O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, era um dos mais exaltados ao defender a conquista do lobby sindical . Disse que aquela comemoração estava sendo possível porque Lula não esquecia suas origens de sindicalista.

- Incomoda a um segmento da sociedade, a uma elite que não se conforma com o nosso sucesso (...) Mas vão ter que nos aturar durante muito tempo - disse Lupi.

Antes dele falaram os representantes das cinco centrais sindicais já reconhecidas. Além de CUT, Força Sindical, Nova Central Sindical dos Trabalhadores (NCST), União Geral dos Trabalhadores (UGT) e Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB), outras seis centrais estão pedindo registro, já de olho no imposto sindical.
Sindicatos pedem apoio para criar novo imposto

O presidente da CUT, Arthur Henrique, pediu apoio de Lula para outro projeto que visa a unificar o imposto sindical com a contribuição assistencial, hoje opcional. Se aprovado o projeto, o trabalhador sofrerá uma nova facada no bolso. A taxa assistencial passaria também a ser obrigatória.

- Jamais aceitaríamos que um órgão do governo fiscalizasse o movimento sindical. E o presidente Lula teve a coragem de fazer o veto. Por isso tem 73% de aprovação, porque é um homem corajoso - agradeceu Paulinho.

Ao pedir apoio de Lula para outro lobby, o da redução da jornada de trabalho para 40 horas, e da regulamentação da convenção 158 da OIT - que proíbe a demissão imotivada nos setores público e privado -, o deputado afirmou que o Congresso só faz o que o governo manda.

- Sabemos que o Congresso só funciona quando o governo quer. E sabemos que, neste caso, o governo quer - discursou Paulinho, arrancando risos de cumplicidade na platéia e causando constrangimento a Lula.

O representante da UGT, Luís Salim, fez ironia sobre sua longa carreira no movimento sindical. Disse que era um dos mais novinhos, pois só tinha 22 anos como sindicalista:

- Não estamos preocupados em abrir contas. Mas não queremos ser fiscalizados como a mídia quer, para que não sejamos independentes.
Lula defende desconto de dias parados em greve do setor público

Em meio à festa Lula adiantou que apoiará o novo lobby dos sindicalistas pela redução da jornada de trabalho, e pela ratificação das convenções 151 da OIT, que regulamenta as relações de trabalho no setor público, e 158, que veta a demissão imotivada. Mas aproveitou para dizer que as centrais terão que enfrentar a discussão do desconto de dias parados em greves de servidores.

- Acho que precisamos regulamentar o direito de greve no setor público, não é possível! Fazem greve de três meses, acho que não é por maldade. Mas eu aprendi que só posso ganhar sem trabalhar se tiver de férias ou doente. Se eu não for trabalhar por outra razão, eu não recebo o meu dia. Nós não podemos ter medo de enfrentar esse debate. É uma bobagem! A gente só está tardando uma solução para esse problema - disse Lula, lembrando que o desconto pelos dias parados já ocorre nas greves do setor privado.


Para especialista, veto é um retrocesso

O presidente Lula da Silva cria um mecanismo poderoso de sobrevivência política para além de 2010 ao fazer concessões ao movimento sindical, algumas na contramão do que defendeu durante três décadas, afirma o filósofo Roberto Romano, professor da Unicamp e estudioso do movimento sindical brasileiro. Um exemplo disso, diz ele, é o veto ao dispositivo legal que permitiria ao TCU fiscalizar os sindicatos.

- Lula tem uma popularidade inquestionável e ainda é muito jovem. Ele pode muito bem atravessar esses quatro anos (que separam o fim de seu mandato da eleição de 2014) com uma máquina de oposição afiada, formada pelos sindicatos, e voltar ao poder - disse o filósofo.

Para Romano, o veto é mais um passo de Lula no sentido de controlar o movimento sindical:

- O movimento sindical foi o motor da eleição e da reeleição de Lula. Ele precisa de um sustentáculo organizacional, e o PT não é confiável. Já os sindicatos são hierarquicamente organizados e disciplinados. Isso é essencial para os planos de sobrevivência política de Lula.

Para Romano, Lula delegou poder em excesso a sindicalistas, que se aproveitaram disso por interesses pessoais. Isso criou uma espécie de "neopeleguismo", semelhante ao "peleguismo" enfrentado pelo próprio Lula no fim da década de 70:

- No final do regime militar, alguns sindicalistas como o Joaquinzão (Joaquim dos Santos Andrade, ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de SP), se davam muito bem com a ditadura. O movimento do ABC surgiu como oposição a isso, mas aos poucos vemos um retorno da estrutura montada no final do governo Getulio Vargas, cujos resultados foram desastrosos.

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