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segunda-feira, janeiro 21, 2008

De Alvaro Caputo, vem o artigo abaixo, escrito por Paulo G.M. de Moura

LULA, SERRA OU AÉCIO: QUE DIFERENÇA FAZ?

Por Paulo G. M. de Moura, cientista político

Um pressuposto subjaz às equações estratégicas dos tucanos José Serra e Aécio Neves para 2010. Trata-se de achar que Lula não concorrerá a um terceiro mandato e não tem nomes fortes em suas fileiras a apoiar. Logo, o próximo presidente seria da oposição. Como no campo da oposição só os tucanos têm nomes fortes, o próximo presidente seria um tucano. José Serra, em melhor posição nas pesquisas, posiciona-se como virtual eleito. Aécio, embora nem tão bem situado, também. Se calculismo matasse os tucanos seriam viúvos de um ex-presidente e órfãos de dois presidentes virtuais. Não se curaram.

O calculismo de Serra e Aécio torna-os óbvios e previsíveis no jogo para 2010. Em política, muitas vezes, a essência de um cenário e das estratégias dos contendores é auto-evidente antes da batalha. Mas, saber as estratégias dos e outros, não altera a lógica do processo. O que, sim, pode alterar, é o eleitor. OU a ação tática dos jogadores. Se há algo imponderável na vida humana em sociedade, certamente é o resultado da combinação aleatória das ações dos jogadores do poder em busca de uma posição na qual só há espaço para um ocupante. Que o digam os tucanos, que recusaram abrir processo de impeachment por acharem que o mensalão havia derrotado o presidente petista por antecipação, um ano antes da eleição de 2006.

Não existe lei, escrita ou não, que prescreva a eleição inevitável de um tucano em 2010. Não faz diferença. Mas isso não faz a menor diferença. Na política há leis não escritas que se impõem. A agenda do próximo presidente será uma agenda de esquerda, seja que for o eleito. Por quê?

Pela mesma razão que fez com que a agenda social-democrata de Fernando Henrique Cardoso se impusesse a Lula em 2002. Objetivamente, os fundamentos da política econômica de Lula são os mesmos do antecessor. O que mudou foi apenas o cenário, hoje mais favorável, e as sutis inflexões que os petistas foram implementando, sem nunca mexer na presidência do Banco Central. A única mudança relevante constatada na área econômica do governo Lula aconteceu dentro da cabeça do ministro Guido Mantega que, para estar onde está, precisou esquecer o que pensava e escreveu sobre economia; notadamente, sobre o Plano Real.

Tudo isso só foi possível porque a agenda tucana é social-democrata, como é a agenda petista. As poucas diferenças existentes entre tucanos e petistas são de inflexão. Os tucanos são mais democratas do que sociais e os petistas são mais socialistas e autoritários do que democratas. Os tucanos nasceram do casamento entre um segmento da elite intelectual paulista com o capital e os petistas nasceram de um casamento da elite do sindicalismo estatal com o capital.

Os tucanos são social-democratas ultralight, mais próximos dos ideólogos da superada Terceira Via que uniu FHC a Clinton, Blair e Schröder. Os petistas dobraram a espinha à agenda de FHC. Muitos a contragosto, mas dobraram. Após comprovarem-se confiáveis ao capital, passaram a implementar sutis variações sobre o mesmo tema na agenda de FHC. Começaram com o "Bolsa Família"; um programa social tucano, ampliado, rotulado e carimbado com marca petista criada por Duda Mendonça.

Outro exemplo é a intocabilidade do superávit primário. Pode-se discutir seu tamanho, mas não a sobra de caixa que garante a tranqüilidade os bancos. Mais um exemplo. Os petistas não privatizam, mas também não desfazem as privatizações tucanas. Ao contrário de Evo Morales e Hugo Chávez, Lula prefere que a Petrobrás compre empresas privadas do setor de energia e combustíveis a vá engordando seu monopólio aos poucos. Ao invés de "nacionalizar" as teles, Lula bota os fundos de pensão das estatais a comprar participação acionária, e, a partir dessas, começa a comprar empresas do setor ao mesmo tempo em que estuda recriar a Telebrás para, no futuro, quem sabe, recomprar, aos poucos e sem afrontar o mercado, o controle estatal sobre a telefonia.

Lula, ao contrário de Hugo Chávez, sabe que se tirar a novela das 8 do ar os brasileiros tomam a bastilha e decapitam o rei. Aliás, essa é a única hipótese de haver revolução no Brasil. Esperto, Lula, ao mesmo tempo em que preserva os esquemas tradicionais de compra de mídia com publicidade estatal e decisões governamentais, patrocina a Rede Record para fazer benchmarking e avançar por clonagem da programação, sobre a audiência da Rede Globo; manda criar uma TV governista. A social-democracia petista vai, assim, estendendo os tentáculos do Estado patrimonialista, ocupando como água em terreno irregular, as "falhas" do mercado de mídia nacional. Da mesma forma no mercado financeiro. O Banco do Brasil incorpora o BESC e sonha incorporar o Banrisul. Com os bancos Lula não brinca. Vai com calma por razões políticas auto-evidentes. Mas a diretriz está lá, espreitando oportunidades.

A grande diferença entre o petismo de ontem e o de hoje é de concepção estratégica. A não ser por uma minoria recalcitrante, boa parte da qual se foi para o PSOL, há consenso na esquerda de que a "revolução" é possível sem ruptura. Devagarinho; com lubrificante (desculpe leitor) e uma boa lábia, os capitalistas tupiniquins se deixam seduzir pelo Estado. E até gostam do aconchego protetor.

A grande diferença entre petistas e tucanos é o grau de intervenção do Estado na vida e nos negócios dos cidadãos brasileiros. Não o princípio que ambos consideram positivo e desejável, de que o Estado deva meter o bedelho em tudo, inclusive no que não lhe diz respeito. Esse é o leito sobre o qual corre o rio da política brasileira. Até para mudar o curso do rio São Francisco Lula vai devagarzinho. Cedeu na primeira greve de fome do bispo. Mas, na segunda, não houve jeito. A obra vai em frente, com o voto de silêncio da Igreja.

Estamos condenados a governos tucano-petistas. A diferença entre ambos é apenas de estilo. Se Lula fizer o sucessor, acentuará sua inflexão estatista da agenda tucana. Se o calculismo de Serra e Aécio resultar no que eles sonham, a inflexão terá outro sentido. Mas, mudam o estilo e o timing. Só!

Diante disso, o fim da CPMF, contra a lógica, foi um autêntico milagre. Mas, literalmente, não perdemos por esperar. Lula; Aécio ou Serra darão um jeito nisso. Aliás, já estão dando.

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