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quarta-feira, julho 25, 2007

PORNOCRACIA BRASILEIRA, CORREIO POPULAR DE CAMPINAS 25/07/2007

Publicada em 25/7/2007


Pornocracia brasileira

Roberto Romano

Em La Pornocratie ou les femmes dans les temps modernes, Proudhon, o anarquista, afirma que a pornocracia é a saída feminina do lar recatado, rumo ao trabalho. Urge escrever outro livro, com título igual e terminando assim: “A pornocracia, ou o governo petista”. Vejamos: “Emprenhei a galega, pernambucano não faz por menos”. Pérola do presidente. Na corte, língua e gestos dos áulicos imitam o monarca. O petismo exibe formas dignas de lupanar. Jaques Wagner afirma que um diretor de jornal pode “fazer merda”, mas o periódico não seria “merda”. A titular do Turismo manda que o lesado “relaxe e goze”. E o gesto de Marco Aurélio Garcia! Trata-se de certo padrão indecoroso para intimidar pessoas retas. Wagner está certo: “Partido não dá atestado de idoneidade moral a ninguém”. Mas não apenas da ordem subjetiva vive a república. Nela, a forma respeitosa deve ser unida ao conteúdo idem, se este último existir. Ele não existe na horda governante do Brasil.

Garcia executou um gesto que manifesta a Realpolitik petista. Na história do Brasil era ignorada atitude tão pornogáfica, vulgar e repulsiva. Na sua desculpa, sem deixar o vezo autoritário — o fato, na mente de Garcia, é devido à imprensa — e seguindo os padrões do Agitprop, o ministro diz que desatinou “em âmbito privado”. Falso. O Palácio do Planalto é o lugar mais público do Brasil. Nele, tudo se decide, pois o Executivo domina o Estado. O espaço do Presidente e auxiliares tem mais relevância do que os prédios do STF e do Congresso. Os arquitetos daquele edifício herdaram a tese da transparência entre governo e povo, trazida pela Revolução Francesa. Robespierre: as deliberações políticas deveriam ser feitas “sob os olhos de um número tão grande de testemunhas que nem a corrupção, nem a intriga, nem a perfídia ousariam se exibir”. Os jacobinos tiveram sucessores entre os bolcheviques, sobretudo na ala trotskysta. Brasília manteve em parte o nexo entre governo e cidadãos. As janelas imensas do Planalto são envidraçadas para permitir o trânsito entre as duas faces do Estado. O PT era jacobino no entender de seus adversários. A máscara republicana, nas bravatas do partido, surgiu na esquerda. Dizer que o Palácio do governo é espaço privado, piora a virulência gestual. Garcia privatiza o público de maneira obscena. O próprio ministro não é pessoa privada, pois governa o espaço público.

No Ensaio sobre a origem das línguas”, Rousseau enuncia: “O que os antigos diziam mais vivamente, não expressavam com palavras, mas em sinais; eles não diziam, mostravam.” Na lingua enérgica “o signo tudo disse antes que se fale.(...) Quando o levita Efraim desejou se vingar pela morte de sua mulher, ele não escreveu para as tribos de Israel, mas dividiu o corpo em doze pedaços e os enviou. Diante daquele horrível aspecto, todos correram, armas nas mãos, gritando em alta voz. A tribo de Benjamin foi exterminada.(...) Os profetas judeus, os legisladores gregos oferecem com freqüência ao povo objetos sensíveis que falam melhor por tais objetos do que por longos discursos.”

Alguns gestos dignificam, como o de Gandhi ao pegar o sal proibido pelos britânicos. Outros, envilecem um povo. A resposta à indecência pública foi dada pelo pai de uma vítima do desastre ocorrido em Congonhas: “Onde estão as autoridades dirigentes que, há nove meses, desde o acidente aéreo com o avião da Gol, vêm assistindo à crises sucessivas no setor aéreo, constituindo-se no caos administrativo, cujo resultado são os péssimos serviços oferecidos àqueles que porventura necessitam utilizá-los? Fruto do progresso, do desenvolvimento, ministro Mantega? Relaxar e gozar ou, mais apropriadamente, relaxar e morrer, sexóloga Marta Suplicy? Bem, não é culpa do governo e, sim, da companhia aérea. Que se fo..., não é ministro Marco Aurélio Garcia? E o que acha disso tudo o presidente Lula? A sociedade brasileira precisa dar um basta a esta situação.” (Folha de São Paulo 21/7/2007). Palavras dignas e verdadeiras, barreira erguida contra o mar de vulgaridade em que se afoga o governo.

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