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quarta-feira, agosto 01, 2007

Vaia con Dios...

Lula se recolhe em Brasília após vaias
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Presidente não vai ao encerramento do Pan, com medo de novos protestos

SÃO PAULO
Agência Estado

O encerramento dos Jogos Pan-Americanos não deve contar, neste domingo, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Vaiado por seis vezes na abertura do evento, dia 13, o presidente, que andou recebendo apupos também no Nordeste nos últimos dias, deve permanecer em Brasília durante o fim de semana, de acordo com sua assessoria. Na opinião do cientista político Leonardo Barreto, professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB), as vaias no Pan e o acidente com o Airbus da TAM em São Paulo contribuíram para que Lula ficasse recolhido ou participasse somente de eventos em que a possibilidade de apupos seja a menor possível, em estratégia montada por seus assessores.'Até por conta da sua origem e do seu discurso, o presidente tem uma ligação popular muito forte e, com certeza, sentiu muito as vaias', analisou Barreto. Para o professor, Lula interpretou o episódio como uma demonstração de fragilidade. A oposição, por sua vez, percebeu que o presidente abriu um flanco para críticas.

'As vaias podem ser comparadas ao debate do segundo turno das eleições, em que o adversário, Geraldo Alckmin (PSDB), demonstrou muita agressividade, assustando o presidente', afirmou o cientista político. Ao sair de cena na semana seguinte aos apupos do Maracanã, para Barreto, Lula demonstrou ter acusado o golpe, o que trouxe alento à oposição, acuada pelos seus altos índices de popularidade. O professor atribuiu à ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e ao seu colega da Comunicação, Franklin Martins, a montagem de uma estratégia para blindar o presidente, protegendo-o de vaias. Depois do episódio na abertura do Pan e do acidente com o avião, o presidente só participou de eventos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em capitais nordestinas nas quais mantém altos os níveis de aprovação. Mesmo assim, foi vaiado em Aracaju e Natal.


IMAGEM

O professor de ética da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Roberto Romano, tem um raciocínio que ajuda a entender esse movimento: os políticos são todos ciosos de sua imagem e fogem de cenas de impopularidade explícita; mas o presidente Lula é ainda mais sensível, por cultuar especialmente a própria imagem.

'Ele se torna muito mais suscetível a manifestações públicas como vaias ou críticas, que vai considerar sempre infundadas. O governo autocrático precisa manter-se no Olimpo, como se o governante fosse um deus e não pudesse ser contestado jamais', explicou.

No caso da abertura dos Jogos Pan-Americanos, o professor de ética ressalta o teor do comentário feito pelo presidente Lula no programa 'Café com o Presidente', na segunda-feira, dia 16. Romano vê sinais de que o mandatário brasileiro, envaidecido pelos altos índices de popularidade, desenvolveu uma personalidade baseada na egolatria. O intelectual anotou nada menos que sete 'eu' no comentário.

Na opinião de Romano, isso é mais do que querer se passar por 'homem comum'. O presidente Lula se comportou como se fossem dele os quase R$ 2 bilhões destinados ao Rio para a realização do evento. 'O dinheiro, obviamente, não é dele porque no regime republicano os recursos do presidente e do povo, na forma de impostos, não se confundem.'

Nesse quadro, a tragédia com o avião da TAM trouxe uma agravante: mexeu com um público que, acreditam os analistas de opinião pública, tem perfil semelhante ao que estava no Maracanã e desembolsou até R$ 250 pelo ingresso para a abertura do Pan.

O professor faz questão de lembrar episódios do período do ditador Josef Stalin à frente da extinta União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) para comparar com o que chama de hábito de bajulação de poderosos - que tem se tornado comum no Brasil, na sua visão. 'Na antiga URSS, em cerimônias oficiais, funcionários do partido ficavam ao lado do público com baldes de água, para que as pessoas refrescassem as mãos depois de aplaudir. Assim, podiam aplaudir mais. É isso que se chama culto à personalidade.'

Sem exceção, todos os ex-presidentes também foram vítimas de apupos

SÃO PAULO
Agência Estado

Getúlio Vargas, Arthur Bernardes, João Figueiredo, Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso, Campos Sales. O presidente Lula disse ter ficado 'triste' com a vaia que recebeu na abertura dos Jogos Pan-Americanos no Rio, último dia 13, mas não pode negar que está em boa companhia. Todos os ex-presidentes foram vítimas, em maior ou menor grau, de apupos durante seus mandatos.Em 1979, Figueiredo, último dirigente do ciclo militar, teve de ser contido por seguranças para não entrar em confronto físico com estudantes que o vaiavam e chegaram a agredi-lo e aos ministros César Cals e Danilo Venturini, em Florianópolis, depois que ele comprimiu o indicador e o polegar para xingá-los de forma grosseira. Vargas enfrentou, em 1954, nas comemorações do quarto centenário de São Paulo, sonora vaia de 15 minutos no Jockey Club. É que desde a Revolução de 1932 o mandatário gaúcho era visto como inimigo pelos paulistas, que o combateram.

Ao contrário de Lula, que se constrangeu com as vaias e não fez a abertura do Pan, Vargas, agiu como uma raposa velha da política e cochichou para o então ministro da Justiça e futuro presidente Tancredo Neves, enquanto fumava tranqüilamente seu cachimbo, segundo relato do historiador Fernando Jorge, autor do livro 'Getúlio Vargas e o Seu Tempo, um Retrato em Luz e Sombra': 'Não sabia que o Garcez era tão impopular.' Lucas Nogueira Garcez era o governador paulista que estava ao seu lado A filha de Vargas, Alzira, fechou a cara. Nenhum, no entanto, sofreu tanto com vaias quanto Arthur Bernardes, que governou o País de 1922 a 1926, permanentemente em estado de sítio. No Rio, passando pela Avenida Rio Branco, Bernardes - austero mineiro educado no Colégio do Caraça - recebeu prolongados apupos de populares, que chegaram a bater no seu carro, entre gritos de 'seu Mé', apelido que detestava. Permaneceu, lívido, dentro do carro. Anos depois, ao assumir o cargo de senador, novamente foi vaiado, desta vez por Miguel Costa Filho, descendente do velho inimigo, Miguel Costa.


APELIDO


O campineiro Campos Sales também enfrentou seu calvário. Ele, que governou o País de 1898 a 1902, chegou a ganhar o curioso apelido de Campos Selos por aumentar os impostos, cobrados em selos. Sales encontrou o País em dificuldades financeiras e foi obrigado a contrair empréstimo de 10 milhões de libras em Londres, que lhe permitiu sanear as finanças públicas. Ele e o ministro da Fazenda, Joaquim Murtinho, tiveram de desvalorizar o câmbio e restringir o crédito, o que gerou muita oposição às medidas, consideradas excessivamente duras. Ao voltar à sua terra de trem, Sales, de acordo com o historiador Aureliano Leite, era vaiado toda vez que a chefia das estações anunciava seu nome. Hoje senador pelo PTB de Alagoas, Collor enfrentou muitas vaias, a exemplo de seus colegas, durante o mandato, interrompido em 1992 por um impeachment. Em 1998, apesar de inelegível, dizia que seria candidato à Presidência e foi agredido em Mogi das Cruzes (SP), onde fazia campanha. Faixa-preta de caratê, Collor levou tapas na cabeça e empurrões.

Em termos de confronto físico, nada se comparou, no entanto, à situação vivida por Figueiredo. O então presidente, que visitava Santa Catarina a convite do candidato a governador e hoje senador Jorge Bornhausen, foi cercado por centenas de estudantes revoltados que, portando faixas contra a fome e a carestia, o vaiavam. 'Ele quis sair no braço com os estudantes e precisou ser contido por seguranças', relembra o historiador Fernando Jorge.

Choveram paus, pedras e latas de cerveja sobre os policiais. O presidente disse ter ficado ofendido - 'com os palavrões contra a minha honra e a honra de minha mãe'. Resolveu, então, 'tomar satisfações com os comunistas'. O presidente levou encontrões e o os ministros foram agredidos e derrubados. A polícia distribuiu pancada e sete universitários foram enquadrados na Lei de Segurança Nacional (LSN). FHC, por sua vez, foi vaiado pelo menos três vezes em seu mandato, principalmente durante os desfiles de Sete de Setembro. Em uma ocasião, xingado por militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem-terra (MST), reagiu: 'Eles são desesperados que não têm a mínima noção de educação.'

Em Uberaba (MG), o então governador mineiro, Hélio Garcia, tentou amenizar a situação, de outra vaia sofrida por FHC. 'Em Uberaba, os meninos vaiam até boi premiado.' É uma frase parecida com a do jornalista Nelson Rodrigues, também usada no episódio vivido por Lula, segundo a qual no Maracanã se vaia até minuto de silêncio.

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