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quarta-feira, fevereiro 06, 2008

No Blog Panorama de Mario Araújo Filho, uma surprêsa...
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Terça-feira, Fevereiro 05, 2008


05/02/2008

O cinismo do Executivo

por Alon Feuerwerker

Se houver ônus financeiro nos pagamentos em dinheiro vivo, estaremos diante do absurdo dentro do absurdo. O contribuinte estará a arcar com os altíssimos juros cobrados pelos bancos, só para financiar o conforto de autoridades federais


O que vende é o espetáculo. Talvez por isso, as listas de dispêndios estranhos, absurdos, sofisticados e bizarros estão no foco das revelações sobre os gastos com cartões corporativos no governo federal, a começar da entourage do presidente da República. O maior problema, porém, reside em outro lugar: na impressionante prevalência de saques em dinheiro sobre as compras com o cartão propriamente dito.

Tornou-se público que mais de três quartos das despesas de cartões no governo federal em 2007 foram feitas com dinheiro vivo, sacado com o cartão. São cerca de R$ 59 milhões, num universo de quase R$ 76 milhões.

O que teria levado as autoridades a essa estranha preferência pelos saques? Quem tem seu próprio cartão de crédito sabe que deve fugir da tentação de usá-lo na modalidade de débito, ou de sacar dinheiro com ele. Os juros são proibitivos.

Tão proibitivos que uma parte saborosa dos resultados dos bancos provém da turma que só faz o pagamento mínimo, financiando o resto da dívida. Por isso é que você nunca deve vacilar, por exemplo, quando no restaurante o garçom, ao ver o cartão de crédito que você apresentou para pagar a conta, pergunta se "é débito ou crédito".

A segunda opção evita ter de arcar com os custos financeiros da primeira, de um dinheiro tomado emprestado do banco numa das piores (para o consumidor) modalidades disponíveis. Eis uma dúvida adicional que fica desse imbróglio dos cartões corporativos federais. Quais são as despesas decorrentes da decisão de sacar dinheiro com eles, em vez de simplesmente pagar a conta com o cartão? Para que não houvesse custo financeiro na retirada, seria necessário que o dinheiro estivesse disponível em uma conta-corrente do Tesouro, o que evitaria ter de tomá-lo emprestado do banco. Com a palavra, as autoridades. Quem se digna a responder? Quem pode esclarecer?

Se houver ônus financeiro nos pagamentos em dinheiro vivo, estaremos diante do absurdo dentro do absurdo. O contribuinte estará a arcar com os altíssimos juros cobrados pelos bancos, só para financiar o conforto de autoridades federais que, por coincidência, são exatamente as responsáveis pela leniência diante da escorcha praticada pelos bancos na relação comercial diária com o cidadão comum. Note-se que, no pacote apresentado semana passada como resposta à crise dos cartões, a Presidência da República e o Ministério da Fazenda reservaram a si a prerrogativa de continuar fazendo saques sem limite com seus cartões corporativos.

Será ou não um escárnio se ficar comprovado que estamos pagando juros extorsivos para que autoridades federais saquem dinheiro com cartões de crédito em despesas cuja necessidade não poderá ser comprovada, por supostas razões de Estado?

Mas há uma outra possibilidade, ainda mais perniciosa. Se não estiverem sendo cobrados juros no dinheiro que o pessoal do governo saca com o cartão de crédito federal. Se for assim, o Banco do Brasil estará emprestando dinheiro sem juros para as felizes autoridades ocupantes de cargos de primeiro escalão no governo Luiz Inácio Lula da Silva. Estariam criadas, nesse caso, duas categorias de cidadãos: 1) a corte, com seus privilégios, e 2) as pessoas comuns, com suas obrigações.

O governo federal tem muito a explicar nessa história dos cartões. Quais são as despesas eventuais e emergenciais que justificam um gasto anual de quase R$ 80 milhões? E como se explica que mais de 75% desse total tenham sido operações em dinheiro vivo? Quase R$ 60 milhões despendidos em pagamento de barcos transportadores de funcionários do censo ou de sanduíches para o pessoal do Ibama? Não faz sentido.

Os gastos com cartão, especialmente os saques, são uma modalidade de "verba indenizatória" que o Executivo arranjou para si próprio enquanto finge frugalidade ao receber salários inferiores aos da iniciativa privada. O resultado inevitável é o cinismo. Recorde-se que em 2006, quando os deputados e senadores discutiam para si o fim da verba indenizatória e a aplicação de um reajuste que equiparasse seus vencimentos aos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, apressou-se em dizer que não havia dinheiro disponível. Talvez a bufunfa estivesse reservada para pagar os cartões dos felizardos colegas do ministro e do chefe deles todos. Haja estômago

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